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Resenha: Hagbard no retorno a uma era de aço

Espirais a partir de um ponto central. Líquidos escoando e massas de ar se movimentando. Tudo isso indica vorticidade. Na literatura, apareceu de forma mais revolta, como maelstrom, no conto de Edgar Allan Poe. Só que nos universos fantásticos a coisa é diferente, há a sugestão de uma ruptura mais radical. Adentrar uma dessas estruturas significa girar de forma estonteante. O movimento violento desnorteia, para poder situar através da rachadura temporal.

É isso que o pessoal da banda juizforana, Hagbard, faz em seu segundo álbum. O lançamento do CD Voxtex to an Iron Age será no dia 11/06, no Café Musik, no Folk N’ Roll, segundo Rock Factory do ano. O álbum situa o ouvinte no lirismo dos tempos em que as coisas eram resolvidas com aço; uma sinfonia de espadas dançantes. A banda foi criada em 2010, contribuindo na divulgação do estilo Folk Metal na região. Atualmente, é formada por: Igor Rhein (vocal); Gabriel Soares (teclados e vocais); Danilo Marreta (Guitarra); Rômulo “Sancho” Piovezana (baixo); e Everton Moreira (bateria). O primeiro álbum foi lançado em 2013, intitulado Rise of the Sea King. Já em 2015, foi a vez do Ep, Tales of Frost and Flames, inspirado nas obras de George R.R. Martin.

Capa do segundo Cd da Hagbard, arte por Marcelo Vasco

As bandas que desenvolvem o estilo em uma linha mais Folk, geralmente, retiram seu pano de fundo de histórias e contos populares, valorizando certo regionalismo. O que é tendência, principalmente, no norte do globo. A história da música não deixa dúvidas sobre isso. Richard Wagner, no romantismo alemão, fez óperas a partir da mitologia nórdica. Edvard Grieg musicou sobre a Noruega, na famosa história com trolls e uma Gruta do Rei da Montanha. Zoltan Kodály e Béla Bartok catalogaram o folclore húngaro. Os exemplos são vários. A tendência destas temáticas voltou com a força total, após o sucesso de filmes como o Senhor dos Aneis, O Hobbit e a presença massiva de seriados tipo Game of Thrones.

Crônicas Saxônicas, de Bernard Cornwell, foi a inspiração literária da vez para a Hagbard. Uma série de livros que mistura ficção a realidade, mostrando que as coisas nem sempre estiveram ali. A história de como um reino inglês se tornou Inglaterra, ao resistir na ocasião da invasão dinamarquesa à Grã-Bretanha.

A ponte pra uma nova era

Uma dúvida que fica, e não é para menos, é o porquê de uma banda juizforana cultuar este tipo de conteúdo. O motivo é mesmo pelo qual você, por exemplo, faz uma transferência bancária em segundos ou conversa com um amigo, do outro lado do planeta pelo Skype. É o mesmo, que permitiu que eles pudessem gravar mais ou menos, 80% do álbum em casa, com mixagem e masterização em outro país. Globalização, conhecimento interligado e uma cultura de comunicação sem fronteiras. Em meio a isso tudo, a retomada de um universo fantástico traz magia, desloca o cotidiano corrido da vida urbana, para paisagens bucólicas e uma vida mais simples. O ritmo somente é quebrado pelas batalhas, em que o guerreiro se torna herói.

O primeiro contato com o material, mesmo antes da escuta, o que impressiona é o cuidado com o CD. Um Digipack com belo acabamento e bem editado. Para quem acompanha a cena independente, sabe como é difícil realizar um trabalho assim. As músicas foram mixadas e masterizadas por Jerry Torstensson, no Dead Dog Farm Studio, na Suécia. E já conta a distribuição do selo brasileiro, Heavy Metal Rocks.

Como de praxe em bandas do gênero, o álbum abre com uma faixa instrumental, ditando a ambiência que virá. Falando da totalidade do álbum, há momentos de um tom mais alegre, mas de modo geral, tem uma atmosfera obscura e melancólica, retratando as dificuldades do campo de batalha.

A construção das músicas segue a cartilha do Folk Metal, com melodias típicas. Tradição do gênero, que de certa forma, tenta remeter uma Europa medieval de bardos e menestréis. Elas são encontradas nos teclados e nos arranjos de violino, na participação especial em algumas músicas, de Vinicius Faza. Às vezes, elas aparecem em dobras com a guitarra, outro clichê do estilo. O teclado faz alusão aos timbres de instrumentos de época, o que entra em contraste com o peso das linhas casadas de baixo e guitarra, durante os versos.

Não há muita inversão, a mensagem é direta, mas tudo muito bem feito.

Nota-se no som da banda o entendimento da proposta do Folk Metal difundida mundo afora. Há originalidade na construção e na seriedade dos músicos com as composições, um quebra-cabeças de passagens melódicas, seja de um verso para o outro, ou algum refrão, dando fluidez a escuta.

Da esquerda para a direita: Everton Moreira, Romulo “Sancho” Piovezana, Igor Rhein, Danilo Marreta, Gabriel Soares

Não há estrelismo e o conjunto está sempre presente. No encarte percebemos isso, pois nenhuma música tem a assinatura de um integrante apenas. A hierarquia ou necessidade de destaque é inexistente, tudo parte de alguma necessidade musical, que visa um produto final de qualidade. As únicas exceções são os momentos dos solos de guitarra, presentes apenas em algumas músicas.

Numa conversa com a banda, descobri que o processo de composição é constante e participativo. Inicia-se quase sempre com o Gabriel, que traz alguma melodia ou ideia. Mas, nada impede que os outros quatro também façam. Uma segunda etapa é a entrada dos riffs de guitarra do Danilo, impulsionados harmonicamente pelas linhas de baixo do Sancho. A letra parte de toda banda, respeitando o conceito temático escolhido previamente. Mas, acaba tendo uma versão final do Igor, que adequa as palavras à sua maneira de cantar. As baterias entram e completam o conjunto, reforçando todas as ideias rítmicas desenvolvidas.

Os vocais possuem uma interessante construção. Apesar de guturais, em sua maioria, não são agressivos, mas buscam mostrar a força de um guerreiro. Constantemente, eles são entrecortados por linhas vocais de timbre limpo, geralmente nos refrãos.

No Youtube da banda encontramos duas músicas de divulgação. A primeira é Bridge to a New Era, que mostra de forma direta e reta o som da banda, sem complicações. Uma boa escolha para quem quer começar a conhecer o álbum. A segunda, já mais elaborada, Inner Inquisition, conta com a participação dos vocais de Livia Kodato, em melodias acompanhadas do violino, o que dá um ar mais angelical a canção. Mas, o contraste com o vocal gutural sempre retorna. Nela há um interlúdio narrado, reforçando a história da luta interior de um guerreiro, tentando julgar suas ações.

O lançamento do CD Vortex to an Iron Age, no Rock Factory, volta a abrir mais um espaço para bandas autorais e covers, de Juiz de Fora e região. Quem quiser conferir um pouco mais do som da banda, pode assistir ao clipe de Iron Fleet Commander dirigido por Lucas Monachesi.

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