Woodstock: uma prosa com os músicos
- Carime Elmor
- 10 de set. de 2015
- 6 min de leitura
Um músico chega, andando depressa com um instrumento grudado em suas costas, uma guitarra ou baixo, talvez. O case parece ser uma extensão de seu corpo. Nessa noite, João Reis, músico de Juiz de Fora, está com uma Stratocaster como a que Hendrix usou no Woodstock e, Pedro Tavares, baixista da banda Beatles Rock, também da cidade, com um baixo Hofner, idêntico ao de Paul McCartney.
Fazer o mundo caminhar de volta ao passado. Parar em 1969 para vivenciar o maior festival de rock que marcou culturalmente o mundo é um desejo quase que unânime - penso eu - em relação às pessoas que estavam ali. Mas essa é apenas uma celebração, e o cenário da fazenda em Bethel, NY, foi embalado por uma casa de shows. É uma noite de Bob Dylan, Joe Cocker, Santana, Beatles, Deep Purple, Jimi Hendrix e Led Zeppelin. Todas as músicas reinterpretadas por músicos ou bandas de nossa cidade, porém, na divulgação, os nomes de todos estes vinham entre parênteses, seguidos do nome de quem iriam homenagear. Quem eram os grandes nomes que fizeram com que o Cultural Bar ficasse lotado?
Sorte minha ter decidido às 23h de sexta (14 de agosto de 2015) trocar de roupa e correr para lá. Mas, de fato, não conhecia algumas das bandas locais que se apresentariam, no entanto, a letra da maioria das músicas que não eram deles, sim. E no dia seguinte quase todos falariam “a banda que tocou led mandou bem”, mas talvez não saibam que eles são a Hard Desire, banda de rock independente de Juiz de Fora que lançou no primeiro semestre de 2015 o EP - Traveller - somente de músicas autorais e financiado pelos próprios.

Foto: Carime Elmor
Foi uma noite de covers, porém muito diferente em Juiz de Fora. A decoração tem toques de símbolos hippies, tem um painel gigante atrás do palco principal todo customizado com mensagens de paz e amor, um sofá de chita colorida na entrada, carrocinha de comida, e o mais legal: o palco ao ar livre ficou aberto durante o início com instrumentos e microfone disponíveis para quem quisesse fazer um som. Outro ponto bacana foi ouvir a fala do João Reis enquanto fazia o vocal e guitarra de Jimi Hendrix; ele parabenizou o festival e ressaltou que existem muitos bons músicos se apresentando que possuem ótimo trabalho autoral e que este, também deve ser valorizado. A banda João Reis Trio inclusive está em processo de criação de um EP também com composições próprias. Percebi que essa observação representava todos os músicos e musicistas que foram convidados a tocar no festival.
|CONVERSA COM OS MÚSICOS|
Carrego comigo um celular, outro aparelho que me permite gravar voz, um caderninho e uma caneta. Não completaram 10 minutos que eu havia chegado, quando um amigo que encontrei disse: aquele lá é o Rubinho, ele vai tocar aqui hoje. Na mesma hora fui até ele pedir para entrevistá-lo. Rubens Müller faz parte da banda Blitz Wölfe, mas hoje irá fazer uma participação junto a Hard Desire como tecladista. Ele falou comigo sobre como o festival colaborou para diferentes músicos de Juiz de Fora se unirem, ensaiarem muito e criarem novos projetos. No dia seguinte, por exemplo, fará cover de Creedence Clearwater Revival e The Who, com uma banda construída para o festival. Rubens comenta que, além disso, toca músicas autorais com sua banda, mas que é muito difícil inserir músicas próprias para o público. Clique e dê PLAY
Enquanto algumas pessoas ainda chegam, um folk começa a ser tocado e cantado por Tiago Sarmento e Lorena Fernandes. As músicas de Dylan com vocal duplo feminino e masculino me fazem lembrar Peter, Paul and Mary e trazem um clima muito acolhedor para a abertura do Woodstock Celebration. Há muita criação em cima das músicas, eu que esperava um cover bem certinho, me surpreendo com a originalidade das versões que tocavam. Precisava conversar com um deles sobre esse show.

Foto: Carime Elmor
Depois de um tempo que sua apresentação havia acabado, olho para o alto e vejo que o músico estava no andar de cima, onde eu não tinha como entrar. Atravessei a pista atrapalhando um pouco as pessoas que nessa hora já estavam concentradas perto do maior palco. Fiquei logo embaixo da escada, esperando quando ele fosse descer. Nessa conversa, antes de eu tocar no assunto de músicas autorais, Tiago, que também é da bandaFerrovelho, fala sobre a importância de o público procurar ouvir o trabalho autoral deles. Clique e dê PLAY.
A banda Beatles Rock é a que eu mais conheço, já sei o repertório de cor, mas é a primeira vez que procuro bater um papo com eles. Descobri que os irmãos Luís Gustavo Mandaranoe Roberta Mandarano também possuem um CD de músicas próprias e que o nome Beatles Rock era antes o nome de um evento daRadioleft – antigo nome da banda. Quando a antiga formação fazia esse evento, era quando atraíam mais o público. Partiu daí a ideia de se dedicarem a uma banda de Beatles, mas com um forte diferencial. Minha maior admiração por eles é a autenticidade dos shows. Primeiro porque tem um vocal feminino fugindo dos padrões das bandas covers de Beatles, e também, porque fazem muitas versões totalmente com a cara da banda. Essa é a forma dos músicos poderem criar e terem espaço para mostrar algo feito por eles e não somente reproduções das músicas que já existem há décadas. Clique e dê PLAY
A dinâmica do festival foi de movimentação: terminava uma apresentação em um dos palcos, e outra banda já estava fazendo seu primeiro acorde em outro local. Durante toda a noite o público foi seguindo os músicos, indo em direção ao próximo palco onde começaria o novo show.
Do lado de fora, começava o cover de Santana, uma banda também formada com a intenção de tocar no festival, mas que agora pretende seguir em diante com a parceria entre os músicos que deu muito certo; bastava observar como o púbico estava vidrado nessa hora. Foi surreal.
Antes mesmo de descerem do palco, enquanto ainda estavam na função de guardar os instrumentos, me aproximei e pedi para conversar com um deles, o vocalista me falou: Conversa com o Victor, ele é quem comanda! Victor Castro desceu e me deu toda a atenção. Ele também é professor na Escola de MúsicaEmatech, membro da Acoustic’n’Roll e Bad Bloxx. Vive da música e começa falando em como pensaram aquele festival, já que várias das atrações não estavam de fato tocando em 69 ou se quer existiam, mas fizeram parte do que estava rolando no rock nas décadas de 60 e 70. Além disso, Victor fala sobre música autoral e o crescimento do cenário musical na cidade. Clique e dê PLAY.

Foto: Carime Elmor
A última atração da noite foi a Baalbeck, banda antiga que representa o Deep Purple na cidade. Mesmo às 5 da manhã chegaram com uma energia muito forte capaz de deixar todos acordados e animados. Trouxeram também o vozerão feminino daTâmara Lessa – que cantará Janis Joplin no dia seguinte - para algumas interpretações.
Pedro Mota é integrante há um ano. Era um dia especial para ele: pela primeira vez subiria no palco do Cultural Bar para tocar não só bateria com o cover de Deep Purple, mas também, teclado na Bealtes Rock.
Para entrevistá-lo, ele conseguiu que eu entrasse nos bastidores do Cultural, pela primeira vez fui para o lado de lá. Emoção de primeira vez para mim e para ele! Pedro é estudante de música, estudou um tempo em São Paulo e depois retornou a Juiz de Fora para continuar a faculdade na UFJF. Clique e dê PLAY.
Depois de escutar e conversar com tantos músicos nessa noite, me pego refletindo que mesmo fazendo bastantes shows covers, cada um dos músicos trouxe sua marca e todo(a)s sentem essa vontade de querer mostrar também o que compõem, o que criam. Buscam através de músicas consagradas, ter liberdade para transcender e passarem para a gente o sentimento mais puro que têm em relação ao que gostam de ouvir e tocar. Foi como se estivéssemos ouvindo os ídolos do Rock pelos ouvidos deles.
Através desse texto, queria parabenizar e agradecer cada um desses artistas de nossa cidade. São eles que levantaram a casa e proporcionaram esse momento para todos. Eles que ensaiaram, compuseram, ficaram roucos e com os dedos esfolados de tanto tocar. Sem sombra de dúvida, os astros de rock das décadas passadas são os responsáveis por haver tanto som de qualidade hoje em dia. Mas como Tiago Sarmento destacou: vamos pegar para ouvir o que todas essas bandas têm de música autoral, todos ali gostam muito de estar tocandosons de quem mais os inspiram, mas há um mundo de criações por trás de cada banda e músico que precisa ser ouvido e conhecido por nós.
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