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PAPISA: música das minas para as manas

Fotos: Ana Cláudia Ferreira

“Nada nessa vida é muito real, então eu posso ser natural” Trecho da música "Instinto"

Se você pesquisar no Google, agora, rapidinho, o significado de PAPISA, vai descobrir a história da papisa Joana, ou "Papa João" como ela, mesmo sendo mulher, ficou conhecida. A Joana se disfarçou de homem para conseguir estudar e depois se tornou um papa. A Igreja Católica nunca teve papisas oficialmente, e a Joana só conseguiu ser uma porque se passava por um homem, o que a levou a sofrer punições depois. O grande lance dessa história é que ela teve que ser forte, fugir da sua natureza e precisou fingir ser algo que não era para conseguir fazer algo que queria e era impedida pelo pensamento arcaico e extremamente patriarcal da igreja.

Já a Rita Oliva, personagem especial deste texto, é a PAPISA deste mundo contemporâneo que vivemos. Na última quinta, dia 18 de maio, ela passou por Juiz de Fora para apresentar seu EP, de mesmo nome, e também mostrar a força da mulher na arte, na música e em todos os espaços que ela quer conquistar podendo ser ela mesma.

A história da papisa Joana remete um pouco à história da PAPISA Rita porque as duas têm a força da mulher. A Joana se disfarçou de homem para conseguir ocupar um espaço importante para ela. Já a Rita usou dessa mesma força para enaltecer a própria mulher, a deusa. O PAPISA, disco lançado em novembro de 2016, traz o universo feminino, as dores e as delícias deste mundo feminino. E tudo isso com a voz leve e deliciosa de Rita em nossos ouvidos.

A Rita Oliva é publicitária de formação, mas artista de coração. Ela gravou as três faixas do EP em casa mesmo, sozinha, no estúdio que possui. Para o PAPISA ela já estava se dedicando há algum tempo. Além das canções, ela mesma fez a capa, e o resultado foi lindo, desde as músicas, até a apresentação final. A produção musical independente feminina é carregada de símbolos e caprichos, cada detalhe faz parte de um todo, uma estética que se funde na própria artista.

Naquela quinta-feira o estúdio do Maquinaria foi transformado. Rita, seguindo quase um ritual de PAPISA, trouxe elementos para o cenário: um tecido preto, parecido com um filó/tule, que brilhava, uma lua branca criada pela artista Tatiana Albertini, além dos cartazes da PWR Records e das Malditas. Para completar a magia da noite, veio a apresentação.

Rita Oliva (PAPISA) prepara um cenário místico para seu show se tornar um ritual de música

Ela estava apenas acompanhada de sua voz, da guitarra branca Fender Stratocaster, um set de pedais, mas também de uma mesinha, onde fazia a programação das músicas, como ela mesma explicou. Em cada uma, um som diferente, que completava e preenchia o ambiente. Era o equilíbrio perfeito entre a guitarra, mais pesadinha, a voz doce e os sons lúdicos de fundo. Uma apresentação sensorial. Na resenha do site Rock In Press confirmaram o que a própria Rita já tinha dito sobre o seu EP: um rock de feitiçaria. E no zine das Malditas, produtora do evento, resumiram: indie-místico-sensorial.

Essa pequena frase (um rock de feitiçaria) também conversa bastante com a ideia do nome PAPISA. A gente sabe que papisa é o feminino de papa. Mas existe algo além disso. “Eu fui descobrindo que eu precisava encontrar uma figura interior que me fortalecesse, e daí veio essa figura da sacerdotisa, que é uma figura da mulher que não está atrelada a nenhum homem, porque a gente tem os arquétipos femininos, tem a amante, tem a mãe, a esposa. Então isso está sempre vinculado a um homem, e a sacerdotisa foi uma figura que não estava, é a força feminina por ela mesma”, contou a Rita, que também teve influência das cartas do tarot (a sacerdotisa é o arcano 02). E é isso que faz o disco ser tão especial, e ainda mais a própria Rita, porque lembra o quanto a natureza da mulher é incrível, e que elas precisam se reaproximar disso.

“na sombra, a minha fala

encontra outro tom, rasteiro

e a cor da tua cara entrega

que minha intuição já viu

mas eu não.”

“É muito legal ver como as minas estão unidas”

Além do show da PAPISA, a noite também foi especial por outros atrativos. Quem passou pelo Maquinaria, pode aproveitar mais que música. As meninas Malditas, Ana Cláudia Ferreira, Carime Elmor, Luísa Moreira e Fernanda Castilho, organizaram um evento com música + feirinha + brechó girl power total! Todas as banquinhas eram de minas, e elas vendiam zines, roupinhas, desenhos, bijous e outras coisas legais. Uma das banquinhas era de merchs da Rita, que trouxe camisetas (feitas por ela mesma), CDs e adesivos. Tudo isso fez com o que o ambiente ficasse ainda mais legal, além, é claro, dos pisca-piscas e cartazes espalhados por todas as paredes.

Uma grrl gang de Jufas se uniu para um ritual musical

As Malditas são um coletivo de jornalistas e produtoras culturais aqui de JF. Em novembro de 2016, elas trouxeram a Sara Não Tem Nome e Luiza Brina para a cidade. A ideia é que possam realizar mais eventos como esse, com minas poderosas, assim JF conhece artistas diferentes e que normalmente não circulam por aqui.

Para esta edição, elas também contaram com o apoio da PWR Records, um selo de Recife voltado apenas para as mulheres musicistas, com lançamentos de todo o Brasil. A PAPISA é um desses lançamentos. A ideia do PWR Records é divulgar e fortalecer o trabalho das minas. A PAPISA tinha acabado de voltar do Bananada Festival, em Goiânia, quando parou em JF. Foi uma turnê de 13 dias, rodando de carro pelo Brasil, muitas vezes sozinha. “No Bananada foi muito bom ver muitas bandas tocando (...), muitas bandas com mulheres, e mulheres que tomam a frente da banda e fazem a coisa acontecer, e agora eu estou sentindo que esse protagonismo está sendo reconhecido aos poucos, apesar de a gente enfrentar muitos poréns no meio do caminho, dificuldades, muita mentalidade que não valida isso, mas eu sinto que a gente está desconstruindo isso aos poucos. É um trabalho coletivo interno, externo, das mulheres se afirmarem. Isso me inspira demais na verdade”.

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