top of page

9 anos de Encontro com a música

  • Carime Elmor
  • 16 de out. de 2015
  • 10 min de leitura

Foto: Carime Elmor

Às vezes, tudo o que temos é o tempo de uma carona para contar o sonho mais maneiro que tivemos. Uma ligação rápida e cortada para falar sobre como está sendo a viagem mais incrível de nossas vidas, o intervalo entre os botões do elevador para conversar um assunto sério com o síndico e, assim, hoje, são poucos os minutos que tenho para conseguir dar conta de explicar uma noite tão grandiosa como a de Segunda–Feira, no Encontro de Compositores.

Quem lê meus textos, deve pensar: "tudo ela diz que foi a sua primeira vez. Mas que menina pouco vivida!" E é bem verdade que só fui me atentar para os eventos de músicas autorais da cidade, depois que entrei para a Av. Independência.

Então, novamente, estava eu (me) descobrindo experiências e sons antes nunca tocados em meus ouvidos. E são 9 anos de Encontro, sendo que vivo em Juiz de Fora há 8. Desde antes de eu vir pra cá, já existia essa ideia imaginada por Roger Resende, Arnaldo Huff, Dudu Costa, Edson Leão, Bruno Tuler, Kadu Mauad e outros nomes. A partir dali, nasceu um espaço onde um músico pôde conhecer e admirar a composição autoral do outro.

Foi assim, naturalmente, depois de tentarem alguns encontros no MAMM, falaram com o Eduardo Fioravante e começaram todas as segundas segundas-feiras do mês, a fazer o Encontro de Compositores no bar Cai&Pira. Inicialmente, apenas músicos frequentavam, a fim de mostrar seus trabalhos e trocarem ideias sobre novos anseios musicais. Indo hoje, você verá muitas pessoas naquela casinha com janelas de madeira, sentadas em uma mesa com baixa luminosidade apreciando o repertório musical feito em nossa cidade, de uma forma muito aconchegante.

Era noite comemorativa. A casa estava cheia de pessoas com os ouvidos abertos para o que estava por vir. Ao longo dos concertos, fui conversando com alguns músicos que haviam se apresentado ou já estavam com os nomes anotados no quadro branco – aberto a qualquer pessoa que queira por pra fora suas criações, em qualquer estilo.

Fui para fora um pouquinho e encontrei o Renato da Lapa espiando através do vidro da janela aquele que tomava o palco. “Quando estou no Encontro, fico emocionado e sensibilizado. É muito bonito você ver grandes nomes – porque eu enxergo Juiz de Fora como o berço de muitos artistas – se apresentando, e você ter a oportunidade de mostrar uma música que você fez na sua intimidade, no seu quarto, logo depois. A primeira vez que eu me apresentei foi bem difícil, foi quando estava retomando o Encontro, então estava mais vazio. Tinha o Arnaldo Huff, o Roger Resende, o Edson Leão, o Daniel Goullart, todos tocaram em sequência e depois fui eu. Estava nervoso. Eu nunca tinha subido para cantar na minha vida! E eu lembro de pouca coisa, porque parece que todo o tempo que eu fiquei no palco passou em micro segundos. Quando eu desci, eles me cumprimentaram. Disseram: “parabéns” e eu fiquei: “gente, o que acabou de acontecer que eu não vi?”. Sobre o que eu vou tocar hoje, eu ainda não decidi ao certo, mas eu pretendo tocar uma música bem forte que eu escrevi com o Rafa Castro e o Vinícius Steinbah chamada "Fronteira". Uma composição bem emocionante para mim. Conta a história de um homem que estava no seu limite, procurando se descobrir, mas ele se encontrava no ambiente errado, se sentia como um peixe fora d’água. E no final, ele percebe que a procura interior é o grande segredo. Acho que é um pouco do movimento que tem acontecido na minha vida ultimamente.”

Monique Leitão havia cantado em tom alto e com muito entusiasmo, junto com Tiago Sarmento. Foi uma composição pensada pelos dois, com melodia mais pesada e letra bastante forte. Não era samba, nem bossa, era Rock. “Antes, o pessoal do Rock’n’Roll acabava ficando meio de lado, mas com o tempo começou a vir mais a moçada do Rock. Hoje a gente já perdeu esse receio. Eu liguei pra ele e falei, “Eu vou lá, você vai? Então vamos fazer uma.”

O Tiago Sarmento foi uma companhia enquanto eu assistia às apresentações múltiplas, feita com várias mãos e vozes diferentes. Já é frequentador do Encontro de Compositores e conversou comigo sobre como o momento estava sendo especial. “Acho que talvez tenha sido hoje a vez mais bacana aqui, porque tem mais gente, mais amigos, mais pessoas queridas. A primeira música que eu apresentei, eu compus esse ano. Eu estava lá em Ibitipoca, e foi aquilo que eu falei no palco, eu tenho o costume de só escrever música depressiva, mas para esse próximo disco, eu queria soar mais leve, seguindo a onda que eu estou na vida. Eu não lembro tão bem o que me fez escrever naquele instante. Acredito que seja a vontade de falar para meus amigos relaxarem e levarem a vida mais de boa. É uma das minhas composições mais violão e voz, mais nua, porque eu, normalmente, tenho o hábito de cantar alto, mais gritado, e acho que aqui não é o espaço. Então era a que eu estava mais seguro, mas mesmo assim eu errei a letra. A música que eu fiz com a Monique agora, foi depois de 16 anos que a gente se conhece. Sempre quisemos fazer músicas juntos e assim que entrei no Ferrovelho, eu falei: “vamos fazer música própria”. Difere bastante das minhas mais violão e voz. Eu fui pegando alguns riffs, fiz a melodia e mandei pra Monique, que criou essa letra profana.”

Quando estava voltando para dentro do bar, vi o Breno Mendonça se entretendo junto a alguns amigos, fiquei parada por perto, com vergonha de interromper o papo, mas até que consegui uma brecha. “Aqui a gente tem uma reunião de amigos de muito tempo, eu moro em Belo Horizonte e faz bons anos que não venho aqui, onde posso ver meus compositores favoritos. São pessoas que fizeram parte da minha trajetória musical e eu fiz parte da deles e, naturalmente das nossas vidas. Porque vivemos a música juntos há muito tempo, e fomos aprendemos juntos. Esse Encontro é uma oportunidade de reencontrar a música e encontrar canções novas. Eu toquei a Julieta, do Wagner Souza e do Gabriel Lobo, com participação do Dudu Costa. Elá é uma música antiga e a gente a reviveu hoje. Aqui tem essa proposta, também, de tocar músicas frescas e ser apresentado a novas percepções, em um dia qualquer, em plena noite de segunda, fugindo da rotina. Acho que mais da metade das pessoas que estão aqui, eu devo ter tocado uma música ou já compus junto. E eu vejo que tem muita gente nova chegando, essa é a prova de que existe em Juiz de Fora uma fermentação artística com uma identidade e autenticidade própria.”

Brunno Esteves é jornalista e estava trabalhando na cobertura do Encontro também. Aproveitou que estaria por lá e decidiu fazer seu som. “Estou fazendo ambos os meus trabalhos em uma noite só. Uma música que vou fazer é um country, misturado com umm folk, mas com uma letra que tem um toque brasileiro, estilo Alceu Valença. A outra é uma letra mais recente, introspectiva e que fala de questões pessoais que já sofri. É uma satisfação tocar aqui, porque eu sempre penso na questão orgânica musical. A música pra mim é uma coisa que vai muito além, trata-se de um estado de espírito. Desde quando comecei a fazer música, muito novinho, sempre senti algo muito forte indo para fora de mim. É a primeira vez que vou me apresentar no Encontro, embora eu já conheça muita gente daqui e já participe da militância da música autoral, principalmente de Juiz de Fora, que é onde eu moro”.

Vira e mexe, o Fred Fonseca estava no palco, fazendo suas músicas ou dividindo o espaço com alguém. Figura forte para o acontecimento desde os primeiros momentos do Encontro de Compositores. “Eu comecei a compor por causa do Encontro, eu fiquei desafiado a inventar algumas músicas a partir do que eu tocava com o Arnaldo e com o Roger. Ver a criação deles me cultivou uma vontade de tentar. Depois comecei a compor direto. Tinha uma época muito boa que eu tocava com o Pampas Gerais, um grupo de música que fazia um som muito gostoso. O Arnaldo tem umas composições muito legais que traz um pouco dessa viagem do Sul. Uma vez fizemos um Pocket Show aqui e eu guardo com muito carinho esse momento. Hoje eu já toquei duas músicas do meu primeiro e próximo álbum. Aquela música que é só de vogais eu fiz com o Kadu Mauad. Ela nasceu em 4 horas, foi muito espontânea. Estávamos na casa dele, nos divertindo e conversando. Costumamos trocar muita poesia, e aí começamos a criar desafios de palavras um com o outro. Até que a gente chegou ao ponto de falar só com vogal, e eu disse: “vamos fazer uma música com isso?” Começamos a rir e a escrever, depois ficamos chapados de tanta vogal e não conseguíamos falar outra coisa. Mais tarde ainda vou cantar uma junto com o Nathan Itaborahy que chama Pessoas. Foi uma coisa inusitada, ele me deu um quarto da música pronta e aí eu fechei junto com ele, ele foi lá em casa, a gente compôs. E o massa é isso: o Encontro proporciona essa troca, a oportunidade de haver encontros que a gente não teria. O Nathan foi figura que eu tive mais contato aqui. É você ir encontrando encontros, um pleonasmo em si muito divertido.”

Eu só tinha visto o Nathan tocar bateria em uma banda de rock. Dessa vez, ele me surpreendeu. Com violão e voz, fez uma música junto com o Fred Fonseca e também composições somente suas. “Ao mesmo tempo em que dá um medo, as pessoas te acolhem. O que você está fazendo musicalmente tem sentido para os músicos, eles entendem o nosso processo de compor, o cuidado e trabalho que você teve. Quando eu estou em um coletivo, eu consigo me esconder atrás do instrumento, mas quando estamos somente eu e o violão, é uma exposição muito grande. E isso é massa, porque me deixa em um estado muito forte que não consigo nem explicar. Eu acabei de tocar duas músicas que eu nunca tinha mostrado em público e eu vejo a primeira resposta nos olhos das pessoas, essa é a primeira troca. Santa Garganta é uma música que eu estou há um tempão nela, ela fica rodando na minha cabeça. Eu forcei a barra para poder tocar ela aqui hoje, mas tem uns três meses que estou trabalhando nela. Minha namorada é cantora e é forte essa coisa da música entre a gente. Eu sou músico e quando vejo alguém no palco isso mexe comigo de um jeito especial. Ela fala desse exato momento que ela está no palco e eu estou embaixo, em que eu estou meio sem lugar, acontece um sentimento muito doido de desterritorialização e também um sentimento de ficar feliz um pelo outro, que é fantástico.”

Me deparei com a Laura Januzzi e o Estevão Teixeira treinando na calçada a música que entrariam para cantar, fiquei olhando de relance, ouvindo e me encantando pela forma como saía tão bonito. “Foi através da música que conheci a Laura, ela tem a voz linda e não tem jeito, vamos fazer esse e muitos outros trabalhos. Essa música que vamos apresentar hoje chama Desejo de Alguém, são viagens durante sua vida, o que passa por você e por quem você sente desejo, pessoas queridas, é uma música que passa a ideia de um filme. Eu conheci a Laura na “Casinha”, um estúdio na casa de um amigo, em uma reunião de músicos que fazemos frequentemente. E hoje a Laura é minha aluna.”

A Laura, junto com a Juliana Stanzzani e outros músicos são a nova geração que estão dando continuidade ao Encontro de Compositores. Conversando comigo, me surpreendi em saber como o Encontro foi fundamental para hoje ela estar, por exemplo, lançando seu álbum Ondes. “Eu lembro perfeitamente da minha primeira vez aqui, porque foi o primeiro lugar que eu toquei na vida, o primeiro microfone que eu cantei foi o daqui, em 2012. Lembro-me do Edinho e do Bruno que faziam a organização na época, como me receberam bem e eu, muito tímida, falei que não iria cantar, e eles me incentivaram. Eu aprendi que aqui é esse espaço acolhedor, que recebe gente de todas as tribos. Foi uma música que chama Viagem Astral, eu só tinha essa na época. Depois que você vem, te dá vontade de compor, de criar e desde esse dia eu não deixei de vir nenhuma vez no Encontro, não faltei um, todo mês estou aqui. Nesse dia que quase morri do coração, eu cantei toda torta, não sabia arrumar o microfone, estava todo mundo olhando e só tinha grandes compositores: Kadu Mauad, Dudu Costa... e como que canta depois disso tudo pela primeira vez? Aqui eu encontrei parceiros de música e meus amigos são frutos do Encontro. Tenho música com o Kadu, com o Fred, com a Juliana, com o Dudu, com o Caetano. A gente começa a produzir e a fazer parceiros musicais”.

Terminei a noite batendo um papo com dois dos criadores desse movimento. Primeiro falei com Dudu Costa, um pouco depois de ter ido ao palco. “A gente sacou na época que tinha muita gente compondo, mas não tinha espaço para mostrar, então criamos o Encontro de Compositores. Eu gravei um disco pela Lei Murilo Mendes – Império de Sal - há um tempo, e todas as músicas do disco foram crias do Encontro, nasceram através de parcerias e troca de ideias. O meu disco foi resultado dessas noites e outras pessoas também fizeram discos de muitas composições que surgiram aqui. Depois, o Encontro ganhou uma certa visibilidade, começou a vir uma galera de outros lugares mostrar seu som e a proposta é ser eclético, é só chegar e colocar o nome no quadro”.

Por fim, ao som dos acordes do violão que mesmo na madrugada ainda não estavam nem perto de cessar, falei com o Roger Resende. E o curioso é que, conversando com os novos, eles me disseram do nervosismo que é tocar na frente de artistas consagrados como o Roger, porém ele próprio mostra que essa sensação de frio na barrifa ainda acontece com ele, mesmo depois de 9 anos. “A gente quando vem pro Encontro, viemos relax, mas quando chegamos, ficamos com um nervoso do caramba. Às vezes acontece de tocarmos música que não fazemos constantemente, aí eu chego meio inseguro. Eu escolhi o Camboja e o Tumbeiros para hoje, porque o meu parceiro Bruno Tuler está aqui. O interessante é que cada Encontro é diferente, isso é uma peculiaridade, cada encontro é uma noite única e possuiu um novo astral. Igual a um teatro. Eu acho que aqui teve e tem um aspecto fundamental para incentivar os compositores a gravarem suas músicas autorais, é um Encontro não só da questão musical, mas um encontro de amigos, todos guardam esse dia para fazer esse intercâmbio musical. E a gente espera que dure para sempre.”

 
 
 

Comments


Mais lidos
Posts Recentes

© 2015 por Avenida Independência. 

 

bottom of page