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"O Bloco Valvulado na Avenida: o dia em que a Terra parou"

  • Carime Elmor
  • 1 de dez. de 2015
  • 5 min de leitura

Fotos: Bernhard Santos

Quando vi o Parangolé ocupando o palco, no último sábado (28), todos os membros carregados de penduricalhos, foi uma sensação de estranheza muito grande: parecem mesmo de fora da Terra. E não são somente três ou quatro: é um bloco de carnaval! Tentei contar durante o show, mas perdi a conta. Me atrevo a dizer um número perto de 40 pessoas. Vem agora flashes de alguns detalhes. A Uiara Leigo, única mulher cantora do bloco, estava com as pálpebras preenchidas com purpurina furta-cor. Lucas Soares, também vocalista, pintou uma faixa preta no olho, meio indígena. Cantava, se remexia e vibrava - saiu de lá rouco. Edson Leão, cantor, com seus cachos característicos, usava além dos apetrechos comuns a todos, um óculos estilo “gatinho” colorido. Estética futurista de camelô. Danniel Goulart, guitarrista, é quem dá o toque rock’n’roll ao frevo – e isso fica escancarado em seus óculos laranja, com o escrito “Rock”.

Parangolé Valvulado - Danniel Gourlat

Havia muitos Valvulados com bandanas reluzentes e anteninhas de bolinha prateada. Valéria Faria, uma das fundadoras do bloco, foi quem criou os acessórios e fez a produção do pessoal. Com a maquiagem carregada nos olhos, batom quase preto, passava uma imagem mais dark, contrapondo a cor das fitas dos chocalhos e que também percorriam todo o palco. Os signos que carregam na aparência é uma miscelânea: meio new wave ou glitter rock carnavalesco, sei lá.

Parangolé Valvulado - Lucas Soares

É noite de apresentação do mais novo frevo! Uma multidão em torno deles irá homenagear um dos símbolos do rock brasileiro: Raulzito, que, depois de descobrir-se uma metamorfose ambulante, tornou-se Raul Seixas. Em 2016 pode ter gritos de “toca Rauuuuuuul” à vontade.

Quem abriu o show do bloco foi a banda A Zagaia. Noite bonita no Cultural Bar que abriu a casa para receber a música autoral independente de Juiz de Fora. O power trio tocou músicas de seu novo álbum “10 anos + 1”, e também já começou ali a entrar no clima do tema do frevo enredo do Parangolé.

Fiquei com muita vontade de falar com uma das pessoas que vi com camisa do bloco. Mesmo envergonhada, me aproximei de um deles, que muito simpático, no mesmo instante me levou até o camarim.

ENTREI NO CAMARIM

Uma expressão simples para descrever minha primeira impressão quando bati o olho no pequeno cômodo abarrotado é: “que doido!”. Fiquei em um cantinho perto da porta piscando o olho e vendo aquela movimentação de gente alegre. Parecia-me mais a coxia de um teatro: um maquiando o outro e terminando de se vestir. Sentimento de empolgação e adrenalina, só faltava se unirem e gritarem “merda pra você!”.

Parangolé Valvulado - Banda

Acho que Sílvia Gouvêa Calian percebeu minha timidez e foi me cumprimentar. O curioso foi saber a história de como ela começou a fazer parte daquilo tudo: “Estava em um ensaio do Parangolé em um clube, de repente me chamaram porque estava faltando alguém para tocar chocalho. Eu falei que não sabia e que não tinha noção de ritmo. Mas fui lá e não saí mais, é muito gostoso fazer parte”. Com os Valvulados é assim: desde o início em 2008, juntava quem queria batucar.

Aos poucos fui me situando e encontrei outras pessoas para conversar. Hudson Coelho, é um dos responsáveis pela composição e dá voz a letra. E é até contraditório usar a palavra “responsável” em um grupo de músicos e musicistas da cidade que só tinham a pretensão de se divertir. Hudson conta que o bloco acabou crescendo e tomando proporções não esperadas. A partir daí, entraram em um dilema: continuariam do jeito que eram ou colocariam um mínimo de ordem. “Como agora sabemos que estamos tocando para um público interessado em nos ouvir, temos que tomar mais cuidado com a qualidade do som, tivemos que dar uma organizada”.

Antônio Tico Moraes hoje é o produtor, mas já tocou no bloco também. Conta que até o ano de 2014 saiam na rua em um trio, com as pessoas seguindo, mas por causa desse crescimento, tiveram que fazer, neste ano, na Praça da Estação, com o bloco parado. “A prefeitura nos chamou esse ano de Bloco Tradicional de Juiz de Fora, e disseram que com a quantidade de pessoas que carregávamos para o meio da rua, estava impraticável de acontecer. Tocar na praça foi um dilema, a maioria dos blocos de carnaval é em movimento, mas em contrapartida, a qualidade sonora melhorou muito”.

Carlos Fernando, colaborador do nosso blog, toca caixa e canta. Batemos um papo e ele destacou outros aspectos que vão além da música: “O Parangolé traz, também, muitos elementos das artes plásticas”. É uma mistura rítmica de influências múltiplas que conversa ainda com outras manifestações artísticas, que víamos estampadas em seus figurinos.

Depois disso, todos correram para a foto oficial e em instantes o espetáculo iria começar. Interessante é a iniciação que propõem ao público. Quando ainda vão começar a entrar, uma voz feminina imitando a “voz de aeroporto” ou de aeromoça, convoca em línguas diferentes para embarcarmos na experiência da “viagem”.

Fiquei imaginando Raul Seixas vendo aquela gente fazendo um carnaval contraditório, homenageando o baiano de Salvador, que colecionava discos estrangeiros até se tornar um astro do rock verde-amarelo. Mergulhado às alucinações, deboches e críticas inteligentíssimas à sociedade, Raul se divertiria vendo o Parangolé citar frases completamente rasas de não-poetas brasileiros, o que tornou esses momentos muitos cômicos. Raul Seixas, inclusive, já esteve no I Festival de Rock de Juiz de Fora e tocou “Sociedade Alternativa” junto ao Toninho Buda, em 1983. Na noite de sábado, o hino foi tocado e rememorado pelos Valvulados.

O Frevo 2016 foi apresentado e foi bonito de ver que o público já conseguia acompanhar, já que a letra foi disponibilizada na internet dias antes. Composições antigas, bem como os famosos esquentas, que inclui até Pink Floyd, também entraram no repertório. Durante um solo de guitarra de Danniel, o bloco foi ao chão – deitaram no palco amontoados, sintonizados e energizados pelo som. Coisa engraçada de se ver.

Parangolé Valvulado

Ao fim desse pré-carnaval, conversei com o guitarrista sobre a ideia do tema deste ano: “Raul sempre foi um nome que viraria tema. O Parangolé é um Bloco de Anti Carnaval, controverso, e isso vai muito ao encontro da figura irreverente de Raul Seixas”. Falamos também sobre a mistura de referências nas músicas do Parangolé e do artista homenageado – autor do famoso mashup de Asa Branca com Blue Moon of Kentucky. Parangolé já começa por ser um bloco que toca frevo, ao invés de samba, ritmo de carnaval mais comum no sudeste. Danniel corroborou o que falei sobre as bandas e grupos de hoje estarem fugindo de uma categorização, não querem estar presas em um só lugar da música – “é coisa da pós-modernidade”.

Já indo embora, encontrei com Nathan Itaborahy, o mais alto da bateria do bloco, talvez um dos mais novos em idade. Ele contou como começou a fazer parte: “um dia cheguei para tocar com outra banda, e me deparei com fim do ensaio do Parangolé Valvulado. Eu já gostava demais e sempre tive vontade de tocar junto com eles. Nesse dia mesmo, pedi ao Ângelo [fundador do bloco] para entrar”.

Parangolé Valvulado

Gostou do que leu e quer saber mais sobre o Parangolé Valvulado? A 2ª edição da Revista Avenida Independência, com lançamento marcado para o dia 16 de dezembro, possui uma seção especial destinada ao bloco, escrita por Isabella Gonçalves.

 
 
 

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