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Sobre bandas, o show e a produção

  • Carime Elmor
  • 21 de jan. de 2016
  • 7 min de leitura

Em uma noite de chuva fininha e incessante, a The Basement Tracks, a Pedra Relógio e a Rádiocafé preencheram toda madrugada de sábado para domingo no Cultural Bar. Nesse dia, senti que o espaço estava um pouco diferente: não parecia uma festa onde as pessoas vão beber e muitas vezes nem se atentam para os caras que ensaiaram tanto para se apresentar, pelo contrário, imersos em seus casacos em pleno janeiro, junto a rodas de amigos, foram lá para conhecer o repertório das bandas ou apresentá-las à alguém. A ideia mesmo era a de um pub, aonde a galera vai a fim de escutar um rock de dosagem alternativa - no sentido de ser menos conhecido.

A proposta é a de ser uma noite de música indie, mas eu fico me perguntando: como categorizar um rock indie? O que faz com que uma música seja etiquetada com esse nome? Eu fui atrás de algumas definições que caíam sempre na questão de fugir do mainstream, circular em selos independentes e estar fora do circuito comercial de TV e rádio. E, justamente, por estarem out dessas vias, a internet é o meio para esse movimento rodar, onde é possível disponilizar de forma mais econômica e livre, músicas, vídeos, fotos e interagir diretamente com quem segue seus perfis. As bandas ditas ""indies"" se mostram como querem, teóricamente sem amarras. Então me questiono: será que esse estilo não significa também a completa fuga de se enquadrar em um só lugar? Ser uma banda indie seria então negar essa própria nomenclatura? Talvez signifique ter total autenticidade na hora de criar, experimentar, usar efeitos na guitarra, na voz, ou seja, testar, brincar de compor com a única finalidade de se divertir e fazer alguma coisa que consideram bacana poder tocar e ouvir.

The Basement Tracks abriu o evento Arena Indie Rock intercalando músicas do Songs from the Orange com outras que, possivelmente, serão faixas do próximo álbum com lançamento confirmado para este ano. Em março, os rapazes da The Basement - Ruan Lustosa (guitarra), Rodrigo Baumgratz (baixo), Ruy Alhadas (teclado), Lucas Duarte (bateria) e Victor Fonseca (vocal) - vão lançar um novo clipe que já foi gravado e está sendo finalizado. A banda ensaia toda semana e, por isso, já estão muito bem conectados e em harmônia um com o outro no palco. Sobre tocar em uma banda independente, o baterista falou: "pra gente é muito fácil, porque a gente gosta. A gente paga pra ensaiar, gasta dinheiro com equipamento, mas a gente toca as músicas que a gente gosta, as nossas músicas. Pra mim é moleza, é tranquilo e não tenho nada pra reclamar". Victor falou sobre o momento bom que está tendo em Juiz de Fora para as bandas: "tem bastantes coisas aqui com qualidade sonora e visual que são ótimas, mas as pessoas em Juiz de Fora estão perdendo a oportunidade de conhecer um momento bom que a gente tá vivendo. Isso tá rolando e são bandas muito diferentes umas das outras, tem o Traste que é super porrada, tem a Vivenci que é uma pegada mais anos 90 e essas bandas estão, sem querer, se unindo. Hoje eu passei no Maquinaria e vi o Guido Del'Duca e as pessoas tavam gostanto, teve a galera da Visco aqui hoje também. Os músicos estão amando esse momento, mas tem gente que tá realmente perdendo".

Um plus do show foi a homenagem ao David Bowie, a The Basement Tracks resolveu apenas uns dois dias antes do evento a tocar Heroes e não tem como esconder o quão emocionante foi, tanto para os músicos, quanto para quem assistia.

The Basement Tracks - Crédito: Paula Duarte / Zine Cultural

A noite seguiu com a Pedra Relógio, banda de São João Nepomuceno. Para minha surpresa, (eu achava que o evento tocaria apenas músicas próprias) a banda fez mais covers do que autorais. Conversando com o Marcelo Furtado (vocal), o Eduardo Goulart (guitarra), o Vitor Brow (bateria) e o Diogo Lanini (baixo) no backstage, logo após o show, eles me explicaram o porquê. Preferiram não antecipar as músicas que ainda não foram lançadas e que vão compor o primeiro EP da banda, uma vez que ele ainda não foi gravado. Por isso, o repertório foi basicamente de sons de bandas de rock alternativas mais consagradas; Arctic Monkeys e Strokes, por exemplo, fizeram parte do setlist. Mas não deixaram de ressaltar que a intenção é poder voltar ao Cultural Bar para fazer um show completo de músicas próprias. Voando alto, a banda vai gravar seu primeiro trabalho em São Paulo, com o produtor musical Lampadinha. Na noite de sábado fizeram três autorais que muito provavelmente vão entrar nessa gravação: Pois é, Vira-Lata e uma mais nova, Quando for a hora. Dentre suas inspirações, a banda carrega Queen of the Stone Age, Blur e Pixies, sem deixar de passar por referências nacionais, como Milton Nascimento e Tim Maia. "Como isso influência a nossa música eu não sei dizer, é uma coisa que a gente toca e sente dentro da música", explica Marcelo.

Eu tava conversando com eles sobre como fazer para compor algo que fuja do que já existe aos montes por aí, como fazer a Pedra Relógio conseguir ser diferente, e se eles procuram ao máximo uma singularidade ou não, e aí o Eduardo respondeu: "Mesmo sem ter um direcionamento bem claro na nossa cabeça sobre qual é a nossa sonoridade, a gente busca se diferenciar das outras bandas. Então se a gente compõe uma música, e nos estágios iniciais, fica muito parecida com outra coisa, a gente já corta, proque isso a gente também não quer. Eu acho que todas as bandas que eu gosto tem originalidade como ponto forte, então se for para eu ser músico e fazer som autoral, eu quero ser o mais original que eu conseguir". O nome da banda foi também ele quem batizou: um dia Eduardo estava passando perto de uma montanha conhecida como Pedra do Relógio, que fica na cidade natal do grupo "eu tive uma sensação muito boa naquele lugar enquanto eu estava lá, aí eu sugeri, todo mundo gostou e ficou".

Pedra Relógio - Crédito: Paula Duarte / Zine Cultural

Para fechar o Arena Indie Rock, a Radiocafé entrou com seu toque de rock britânico e seus instrumentos bacanas, incluindo até mesmo um banjo, e tocou o próximo álbum a ser lançado na íntegra e que já foi gravado. O álbum tem 12 faixas e conta com trabalhos de 5 anos atrás até hoje. Ou seja, foi pegando várias fases da vida dos músicos, e o legal, é que tem composições de todos os integrantes, que são: o Dudu Barba (baixo), o Rafael Ski (guitarra), o Rodrigo Coura (voz/guitarra) e o Tiago Viana (bateria). "A cada música nova que surgia, a gente trabalhava, produzia e registrava. Viemos gravando até chegar em um total de 12 músicas. Esse álbum tem uma verdade e o lance do contexto em cada uma: em 5 anos nós ouvimos e vivemos muitas coisas diferentes, então ele trás um pouquinho de cada época que a gente passou. Eu acho que a única pretensão do disco é ele representar a Radiocafé, é ser uma parada verdadeira, compilar isso tudo e trazer em um produto só", comenta Tiago.

A Radiocafé tem 10 anos e, ainda no antigo Cultural, fizeram parte de uma coletânea de bandas organizada pela casa, mas desde então, no espaço atual, só tinham tido a oportunidade de se apresentarem uma vez, durante o festival Grito Rock. "A gente tá tendo uma oportunidade que pouca gente tem, de chegar no cultural e tocar nosso disco inteiro, e o som aqui é muito bom", fala Rodrigo. Para 2016 tem álbum novo sendo lançado ainda no primeiro semestre, o disco foi financiado pela Lei Murilo Mendes, e agora, com um material novinho em mãos, pretendem tocar muito pela cidade. Nesse terceiro trabalho da banda, gravaram com um dos maiores quartetos de corda do Brasil, que costuma acompanhar artistas como o Caetano Veloso e a Marisa Monte. Além disso, houve a inclusão de um trio de metais e o Walmer Carvalho comandando o saxofone. Em breve, um videoclipe que está em fase de edição, será também lançado e disponibilizado na internet.

Radiocafé - Crédito: Carime Elmor

Ao final, troquei uma ideia com o Sandro Massafera da produtora Arena Rock. Analisando o ano passado (como boa frequentadora dos eventos da Arena) sei que não contemplaram a música autoral de Juiz de Fora. Colocaram vários músicos e bandas da cidade para tocar frequentemente, sem dúvida, mas eram sempre bandas cover ou que faziam releituras. Por isso, fiquei bastante contente quando vi que deram largada em 2016, promovendo uma noite de sábado no Cultural com bandas que tocam repertório autoral. O Sandro me explicou que a Arena tinha um projeto engavetado chamado Rock Set, em que três bandas autorais e independentes de Juiz de Fora tocariam 45 minutos de repertório próprio. Porém, segundo ele, estava sendo complicado colocar a ideia pra rodar em uma casa de show, em que realmente não tem ou tinha o propósito de movimentar a cultura de bandas com som autoral.

Depois de um 2015 mais efervescente para os compositores daqui, a Arena Rock anunciou o evento no formato do idealizado, o Rock Set. Lembro bem de quando abri o facebook e vi, me deixou muito feliz e logo enviei uma mensagem para um dos músicos da The Basement, animada com a notícia. Eu acho que o que a produtora realizou serve de incentivo para as bandas continuarem criando e gravando. A gente espera, agora, que mais eventos como esse apareçam ao longo do ano. Essa é a forma de fazer com que as bandas mostrem seu som, mais pessoas se interessem e comessem a frequentar os eventos, chamem os amigos e assim, a cada vez a casa vai conseguir vender mais ingressos, como um ciclo que vai se adaptando e envolvendo o público. Para Sandro, "o principal para a cena autoral acontecer, são as bandas se envolverem. A gente tem que fazer com que esses músicos entendam que o autoral vai funcionar na nossa região, na nossa cidade, se eles fizerem o público deles. O som que eles fazem é para o público, eles têm que carregar essa galera junto com eles, onde quer que eles apareçam". E ao final, quando perguntei sobre como a Arena Rock pode contribuir, o Sandro falou "trabalhando mais com as bandas, incentivando mais e fazendo com que aconteçam outras noites como essa".

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