top of page

O Bar Silenciou Pt. 5: Sérgio Rocha (Secretaria de Atividades Urbanas)

  • Carime Elmor
  • 13 de abr. de 2016
  • 10 min de leitura

Fotos: Pedro Henrique Rezende

Hoje, encerramos a primeira série de entrevistas do nosso blog. A partir de cinco olhares, com pontos de vistas que ora conversavam, ora se contrastavam, propusemos a reflexão acerca dos espaços para a música autoral em Juiz de Fora. Foram ouvidos os músicos Edson Leão e Thiago Miranda, que estavam à frente das reivindicações acerca da questão, bem como Roger Resende, que, além de atuante do Movimento Música Livre, ocupa, atualmente, uma instância de representatividade para a classe dos músicos: a cadeira da música do Conselho Municipal de Cultura. Outro personagem escolhido para nosso especial foi Greg Ruhena, que além de estar inserido no cenário do rock na cidade, é dono de um bar que recebeu notificação e foi proibido de prosseguir com apresentações musicais. E hoje, por fim, vamos ouvir o órgão da prefeitura de Juiz de Fora responsável por essa regulamentação e pela fiscalização dos locais onde são permitidos e proibidos de oferecer shows, a Secretaria de Atividades Urbanas, pela voz do secretário Sérgio Rocha. Em um levantamento que começou em janeiro de 2013 e foi até o final de fevereiro deste ano, o número de emissões de documentos, entre notificações, intimações e autuações foi de 1.801.

O Secretário Sérgio Rocha da SAU: Secretaria de Atividades Urbanas

Avenida Independência: Sérgio, está havendo uma discussão acerca da retração dos bares em Juiz de Fora que podem ter música ao vivo. Muitos bares receberam notificações nos últimos tempos, e como essa medida é fiscalizada pela Secretaria de Atividades Urbanas, gostaríamos de conversar sobre o que está acontecendo.

Sérgio Rocha: Antes de qualquer coisa, eu preciso destacar que há um mal entendido, uma má compreensão de que eventualmente os nossos artistas não possam se manifestar em algumas casas, vamos dizer, estabelecimentos comerciais da cidade, como bares. Não se trata disso. O importante é que pra realizar esse tipo de atividade, o interessado deve atender algumas exigências da legislação municipal, mais especificamente, do Código de Posturas do Município, que regula toda a vida citadina do complexo urbano. Todos os interesses da vida citadina, que aqui na SAU (Secretaria de Atividades Urbanas) temos um departamento para apreciar eventuais requerimentos de interessados que querem veicular essa produção musical nos seus estabelecimentos. Um elemento que é essencial destacar é o problema da adequação acústica desses locais. Porque aí você vai entender que, muitas vezes, as reclamações da própria população, que, no seu direito legítimo de descansar após um dia de trabalho, às vezes é obrigada a conviver com um estabelecimento ao lado da sua casa que esteja veiculando música mecânica, eletrônica ou produzida por algum profissional, mas em desacordo com os limites de decibéis, ou seja, de intensidade sonora, previstos na legislação.

Na legislação estadual, inclusive, que limita, só a título de informação, do período de 22h à 6h da manhã, 60 decibéis, e de 6h às 22h, são 70 decibéis. Eu deixei pronto para falar aqui com você o parágrafo único do artigo 254, que diz o seguinte:“A medição e avaliação de sons e ruídos produzidos em edificações em geral, nas casas de diversão, nos logradouros públicos, deverão ser efetuadas com aparelho medidor de nível de som [o decibelímetro], obedecendo as orientações contidas nas normas técnicas. Estabelecimentos que produzam sons ou ruídos de qualquer natureza, deverão se adequar acusticamente, impedindo a propagação de som para o seu exterior em limites superiores aos previstos nos termos da legislação própria”. Então eu acho que aqui esclarece de maneira clara e peremptória que, longe aqui da SAU querer limitar o direito de manifestação cultural legítimo, o direito constitucional de manifestação cultural através dos nossos artistas. Mas é preciso que aqueles que são donos dos estabelecimentos, procurem um especialista, que tenha responsabilidade técnica, para que ele busque fazer a adequação acústica desses locais onde, eventualmente, essas manifestações culturais venham a ocorrer.

O que nós temos aqui é o número de diligências fiscais relacionado ao que chamamos de perturbação do sossego público, em função de reclamações, obviamente, de terceiros, que são levadas ao conhecimento da autoridade fiscal e ao departamento de fiscalização de posturas aqui da SAU, mas também através do Ministério Público. Então, as pessoas hoje querem, e nós queremos, é nosso papel aqui buscar harmonia dos diversos interesses: daquele legítimo e sagrado direito do sossego, depois de um dia de trabalho (muitas vezes pessoas que estão acamadas, adoentadas) e daqueles que querem também exercer esse direito constitucional de manifestação cultural. Mas a lei estabelece parâmetros, limites. E aí, não tem nenhum problema, atendido à essas exigências, eu faço aqui mais uma ressalva: existem algumas áreas da cidade onde esse tipo de atividade não é permitida.

Avenida Independência: Quais áreas em Juiz de Fora são proibidas de ter música ao vivo? Áreas residenciais?

Sérgio Rocha: Não saberia te dizer aqui agora porque eu precisaria pegar a lei de zoneamento. A cidade é dividida em unidades territoriais que são espaços geográficos dentro do território do município, onde você tem em algumas delas a autorização legislativa pro exercício de uma atividade, por exemplo, de uma indústria. No centro da cidade não podemos ter uma siderúrgica, porque a lei de zoneamento não permite esse tipo de atividade econômica no centro da cidade. No Vale do Ipê, salvo melhor juízo, ele inicialmente tinha uma restrição contra qualquer tipo de atividade econômica ali, era um bairro eminentemente residencial. A Câmara Municipal veio promovendo alterações no texto original, e, hoje, já se convive lá com uma padaria, um comércio naturalmente pra atender os moradores daquela região.

Avenida Independência: As notificações nos bares foram mais devido ao número decibéis que passava do limite, do que se o estabelecimento tinha ou não alvará de liberação para música ao vivo?

Sério Rocha: É porque esses estabelecimentos, muitas vezes, por não ter adequação acústica, não conseguem o alvará para música. É um bar, restaurante, mas que não está autorizado a promover show musical porque o zoneamento não permite - aí a cada pessoa que requeira, isso será submetido ao Departamento de Licenciamento que vai verificar se naquele local, naquela região, onde o sujeito está requerendo aquela ação, pode.

Avenida Independência: A partir do momento que o estabelecimento recebe essa notificação, ele consegue um prazo para realizar a obra de adequação até poder voltar a ter música ao vivo?

Sérgio Rocha: Primeiro ele é notificado de que há uma reclamação contra ele ou em face dele, aí ele é notificado a providenciar as melhorias, pra se adequar e obter a licença.

Avenida Independência: Aí ele tem um prazo para fazer isso? Enquanto isso ele pode seguir com as atividades?

Sérgio Rocha: Esse prazo varia entre 10 e 30 dias a princípio, mas ele pode ser prorrogado para até 90 dias.

Avenida Independência: Porque dependendo da obra de infraestrutura requer mais tempo para finalizar a adequação.

Sério Rocha: É, aí imaginemos, ele não se movimenta, aí nós vamos lá de novo, botamos o aparelhinho, caracterizou a infração administrativa por estar veiculando som acima do que é permitido pela legislação, ele vai ser autuado.

Avenida Independência: E eu estou me perguntando aqui, quantas reclamações são necessárias pra haver essa notificação? Porque como você mesmo falou, é preciso conseguir harmonizar dois interesses: os músicos precisam trabalhar, ao passo que tem aqueles que trabalharam ao longo do dia, estão à noite descansando. Então, não é apenas uma manifestação cultural, é muito mais do que isso, é o trabalho dos músicos, é o “ganha pão” deles, a dedicação ao labor. Então eu queria saber qual é esse limite? Precisam de quantas pessoas reclamarem para haver uma autuação?

Sérgio Rocha: Basta uma pessoa incomodada e que o bar esteja veiculando e produzindo qualquer ruído acima dos limites permitidos pela lei. Não necessariamente música: algazarra dentro de um bar, que possa estar produzindo ruído que seja captado pelo decibelímetro para medir a intensidade de ruído.

Avenida Independência: E esse tipo de problema tem acontecido com muita frequência atualmente?

Sérgio Rocha: Muita. Esse é o maior problema hoje da sociedade moderna, um dos maiores problemas que temos hoje na vida citadina. Enquanto uns querem descansar, outros estão em atividade, como você disse - eu usei a expressão manifestação cultural para ser gentil, eu sei que é a atividade e o “ganha pão” desses profissionais - e todos nós adoramos esse tipo de atividade, então eles prestam um serviço. Mas é preciso que haja a harmônia entre essas duas pontas dos conflitos, nós precisamos fazer com que ele atenda às exigências da lei para que ele possa ter sua atividade em consonância com os limites exigidos pela lei.

Avenida Independência: E aí o grande dilema é que muitas vezes esses bares surgem de forma improvisada. Os bares que dão espaço para os músicos da cidade tocarem suas músicas autorais, que saem um pouco do comercial do que é tocado aí, não vou colocar nenhum estilo aqui, mas as casas que dão espaço para esses músicos tocarem coisa próprias e alternativas, elas normalmente surgem de forma mais simples e aí os donos desses lugares realmente não têm, nem recebem dinheiro suficiente do lugar para fazer uma grande obra de infraestrutura.

Sérgio Rocha: Você há de convir que uma coisa não justifica a outra. Para que se estabeleça, tem que ter competência. Nós não podemos conviver com esse improviso em detrimento do sagrado direito ao sossego público, sob o argumento de que eventualmente o empreendedor A ou B não tenha recursos para estar implementando as adequações necessárias no espaço físico dele, para que ele possa exercer a atividade. Não é infrequente não, vou te dar um exemplo, acabou de chegar uma decisão judicial hoje aqui: eu mandei fechar, eu não, depois de cumprir as exigências, eu determinei o fechamento de uma atividade. Vou manter em sigilo, mas eles conseguiram derrubar a minha ordem por uma liminar, e agora o tribunal passou, por causa desse tipo de problema. Nesse caso, o sujeito não tem o alvará para fazer isso e ele está adequado acusticamente, olha só.

Avenida Independência: Mas como ele não conseguiu o alvará?

Sérgio Rocha: Porque lá no zoneamento, não permite. Então, é necessário satisfazer a duas exigências básicas: o zoneamento permitir é a primeira delas, e a outra, é fazer a adequação acústica. Quem faz isso? É um engenheiro qualificado que vai revestir um estabelecimento com um material que possa evitar a propagação desse som pra fora.

Avenida Independência: E aí depois que é feita a adequação eles passam por um tipo de teste sonoro?

Sérgio Rocha: Não, não. Nós não vamos lá fazer um teste. Ele vai funcionar, se a comunidade não está reclamando, a princípio, pelo menos, quer dizer que a coisa não está trazendo desassossego. Mas se alguém, ainda assim, entender que está, cabe ao agente público, com a fé de ofício que ele tem, levar o aparelhinho lá na janelinha que o cara que está reclamando e vai ligar ele no horário que ele está reclamando, de madrugada, durante o dia, qualquer que seja o horário, coloca o aparelhinho e vai ver.

Secretário da Prefeitura de Juiz de Fora, Sérgio Rocha, em entrevista para a Avenida.

Avenida Independência: Existe algum serviço de informação desse tipo de adequação, algum veículo que passe para conhecimento público essa questão do zoneamento e do medidor sonoro, para que futuros empreendedores que vão abrir suas casas levem em consideração a questão do zoneamento e a questão da adequação acústica?

Sérgio Rocha: Eu vou trazer pra você só um mapinha pra você ter ideia da complexidade que é essa lei de uso e ocupação do solo. Obviamente aquele que se interessar, ele pode entrar na Central de Atendimento da prefeitura e falar: “eu queria veicular música, no endereço tal, tal, tal. Posso ou não?”. A prefeitura vai informá-lo. A consulta prévia é uma ferramenta disponibilizada pelo município onde as pessoas podem, antes de empreender qualquer coisa, consultar a prefeitura se ali pode. Mas seria muito difícil a gente ficar pontuando dentro do território. Nós compilamos toda a legislação urbana que está totalmente cheia de retalhos, então você vai encontrar aqui, entre outros anexos, um mapinha que divide as unidades territoriais do município, obviamente em uma simbologia. Por exemplo, ‘zoneamento todo autorizado’, ‘zona comercial’...

Avenida Independência: Bares com música ao vivo seria onde é zona comercial?

Tatiana Julião (Fiscal de Posturas Municipais): O que geralmente acontece é o seguinte, nas residenciais corredor, a lei prevê alguns tipos de exercícios comerciais, aí você tem que ir na lei buscar quais tipos de comércio podem ser exercidos nos corredores. Isso tudo é subdividido, a primeira zona é um tipo de estabelecimento, a segunda zona é outro tipo. Então, vai depender tudo do sossego da área.

Geralmente, você entra com uma consulta prévia: “quero abrir um comércio na rua tal”, esse pedido vem para a secretaria, e a secretaria avalia: “olha, isso aqui pode ser feito nessa área”, ou “não, isso aqui não pode”. E o que que acontece, isso tudo tem que ser feito previamente à abertura de qualquer tipo de estabelecimento e as pessoas fazem o inverso. Elas se estabelecem pra depois procurar, então isso tudo fica mais complicado. E todas essas informações, a partir do momento que a lei é publicada, ela já está em livre acesso para todo mundo, então a pessoa tem que saber a legislação de acordo com o estabelecimento que ela quer montar. Isso tudo tem na legislação direitinho.

Sérgio Rocha: Ficar esmiuçando isso aqui é humanamente impossível, não é pedagógico. O cara tem que falar “quero abrir na Bernardo Mascarenhas um bar e quero vender bebida, quero fazer um restaurante junto e quero veicular música, posso?”, aí ele vai identificar esse endereço, ver em qual zona territorial do município ele está enquadrado e qual uso é permitido para aquela unidade territorial.

Avenida Independência: Vocês trabalham aqui com essas notificações sob demanda de reclamações ou às vezes vocês tem marcado “vamos fiscalizar esse tipo de lugar” e aí vocês saem às ruas fazendo isso?

Tatiana Julião: Os dois tipos, mas desse ponto em específico, as informações são muitas, então a gente é muito demandado nesse ponto.

Sérgio Rocha: O que tem que ficar claro é que nós não estamos aqui para inviabilizar atividade nenhuma. Isso é uma ideia completamente descabida e sem procedência, o que nós precisamos é harmonizar. É comum, muitas das vezes, o sujeito estar reclamando, como aconteceu lá em Santa Terezinha. “Já notificaram o cara?” “Já.” “Não atendeu?” “Não.” “Chama o cara lá”. E muitas das vezes com os reclamantes juntos aqui. Posso citar aí ultimamente o Santa Terezinha, o El Dourado, onde aconteceu isso. Falamos “Companheiro, olha, eles estão reclamando de você isso.” Aí começam as ponderações e a gente busca um caminho. “Eu não vou fazer música, eu vou só de tanta a tantas horas, vou reduzir, vou me adequar”.

Avenida Independência: No El Dourado teve um bar que foi proibido de ter música ao vivo, o Sapirongo’s, não é?

Sérgio Rocha: Esse mesmo, esse cara teve ali, sentado no cantinho e eu falei pra ele: “se você continuar eu vou fechar seu bar”. Nós demos uma chance a ele: “quer se adequar numa boa, não vamos te fechar não”. Eu não tenho esse interesse porque atividade econômica já está difícil, mas é preciso também que o sujeito compreenda que assim como ele quer trabalhar, outros querem descansar.

Tatiana Julião: E a fiscalização é feita de uma forma justa, porque as vezes acontece da pessoa está incomodada, mas a gente vai medir e não está passando do que a lei permite. Então é para os dois lados

 
 
 

Comments


Mais lidos
Posts Recentes

© 2015 por Avenida Independência. 

 

bottom of page