Som Aberto: Back to the 1974
- Carime Elmor
- 29 de jun. de 2016
- 4 min de leitura
Fotos: Rômulo Rosa
Três bandas movimentaram o campus da Universidade Federal de Juiz de Fora no domingo passado, no Som Aberto, evento organizado pela Pró Reitoria de Cultura, a ProCult. Capivaras de Netuno, Cangaia Blues e a esperada A Pá se apresentaram na concha acústica, na Praça Cívica, ponto de encontro de muita gente nos fins de semana. O encontro poderia passar despercebido para quem não conhece a história da Universidade. Mas não para a Avenida Independência. O evento é uma retomada de um evento anterior, porém, em outras proporções. Xico Teixeira, membro da A Pá, participou da criação do Som Aberto, na década de 1970, como um movimento estudantil de resistência à ordem política autoritária, com música, poesia e artes plásticas. Na época, ele começou a ser realizado no anfiteatro do Instituto de Ciências Biológicas.
O festival acontecia todo sábado, e também contava com o apoio do presidente do DCE, o Ivan Barbosa, apesar da oposição da reitoria. “A arte era um movimento de resistência, tem um discurso político e tem a manifestação artística, então, além da música, tinha literatura com o Antônio Marx, tinha fotografia com Milton Valle e Eduardo Arbex, tinha a parte de dança”, recorda Xico Teixeira. A reconfiguração do atual Som Aberto, sob organização da própria reitoria, tornou o evento institucional e congregou outras dimensões artísticas, além de uma feira livre, yoga e circo.
Foi Xico Teixeira quem deu tom político ao evento, puxando os gritos de “Fora, Temer!”, logo no início da apresentação d’APá. O nome do grupo, com 12 participantes, veio de um comentário do músico Fernando Brant na contracapa de um disco do Milton Nascimento em que ele dizia algo como “tinha uma pá de gente tocando nesse disco”. O projeto de Xico une seus sete irmãos, a família Teixeira: ele (percussão), Estêvão (flauta), Faustino (vocal), Domingos (violão aço), Maria Luzia (vocal), João (berimbau) e Henrique (percussionista), fora outros músicos-amigos, da formação original: Marcinho Itaboray (voz e violão), Guto Gomes (violão nylon), Hélio Barbosa (contrabaixo) e Sérgio Evangelista (voz e percussão).

A banda A Pá retomando ao palco após 35 anos desde o último show
Na plateia, amigos dos músicos acompanhavam o show com um repertório repleto de música mineira. “Meu nome é Zé do Cão”, canção de Sérgio Ricardo, é uma das músicas que sempre tocavam em seus shows na década de 70 e foi retomada nesse reencontro. “Vera Cruz”, de Milton Nascimento e Márcio Borges, também estava no setlist, bem como “Desenredo”, de Dorival Caymmi. Teve ainda “Assum preto”, de Luiz Gonzaga, e muito folclore latino-americano, como Duerme Negrito de Atahualpa Yupanqui. Na formação inicial d’A Pá, na decáda de 1970, todos eram universitários ou tinham passado pela UFJF de alguma maneira. Todo sábado eram atração fixa do Som aberto, que começava sempre às 10h da manhã, com músicos de Juiz de Fora, mas de outras cidades também. “Um dos primeiros shows do João Bosco mais profissionais, quando ele estava saindo da faculdade que fazia em Ouro Preto, foi no Som Aberto. O Xico buscou ele de lambreta, ele veio com o violão e tocou”, lembrou Estêvão Teixeira.
Aberto para a música autoral
A banda que abriu os shows foi a com o nome mais inusitado possível: Capivaras de Netuno, que trouxe muita música autoral para o concerto. A pegada é de um rockabilly e isso fica estampado no estilo vintage dos instrumentos, bem como nas letras das músicas, como: “Ela Gosta de Rockabilly” e “Minha Pinup favorita”. A ideia é de se fazer um show divertido, para as pessoas dançarem. Além das duas, os capivaras tocaram “Uma Fora da Lei”, “Dias de Alegria”, “Aposta” e “Desgraçada”. Rolou Creedence Clearwater Revival e Raul Seixas, um lado mais folk da banda. Teve também Cachorro Grande, Mutantes e uma jam session com um entrelaçamento de clássicos de Elvis Presley. Um luxo.

Capivaras Independentes no palco do Som Aberto
Subiram ao palco Brunno Esteves, vocalista e sua guitarra semi acústica vermelha vintage, o outro guitarrista Gustavo Ferreira, o baixista Rogério Martins, o baterista Renan Sena e o tecladista Paulo Careli. Embora a estética sonora passe pelo folk, rockabilly e um rock mais clássico, a intenção é de haver novas experimentações, como explicou Brunno Esteves. “Eu estou querendo pegar um pouco mais da essência sessentista da tropicália, usar um sintetizador e fazer aquela coisa nonsense e iê iê iê do Beatles, mas também uma coisa mais suja e porrada do The Who. E depois transformar isso tudo em uma música em português, porque nossa proposta vai muito ao encontro do cenário do rock gaúcho”.
A terceira banda selecionada pelo edital do Som Aberto foi o trio Cangaia Blues. O guitarrista e vocalista Raony, o batera Lucas e o baixista João. Há quase três anos eles estão tocando pela cidade, essencialmente blues. No repertório eles trazem Jimi Hendrix, The Doors, Buddy Guy, Stevie Ray, Albert King, Raul Seixas e BB King. O Cangaia ainda não tem composições próprias, mas está trabalhando na ideia de criar um blues que quando se escuta sinta e lembre o Brasil. “O blues nasceu nos Estados Unidos, e a letra em inglês acompanha a métrica. É muito difícil fazer em português uma coisa que fique bem bacana, por isso ainda estamos trabalhando nisso”, explica Raony.

O Baixista João do Cangaia Blues
Gostou? Esse foi o primeiro Som Aberto, um projeto piloto, na fase de retomada do evento. A cada mês vai rolar uma edição, sempre com a intenção de abrir um edital para bandas universitárias. Em julho, o evento será no dia 30.
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