"Não posso errar uma nota": Tentativa de spoiler sobre o EP da Drunken Tales
- Túlio Mattos
- 19 de out. de 2016
- 4 min de leitura
Sábado, 15 de outubro de 2016.
“Tô nervoso.
“ Normal ficar nervoso. Quando eu tocava, ficava nervoso o dia inteiro antes de começar o show, mas uma vez lá, é só fazer o que já sabe.
“ Mas eu não tenho esse nervosismo pra tocar cover. O lance é que hoje a gente vai gravar nossas músicas.
“Calma, respira. Quer café?
“Não, valeu. Ou, acho que vai começar”.
Essa foi a última vez que eu conversei com o Matheus Medeiros, meu veterano na faculdade e calouro na Avenida.

Foto: Anne Elise Landine
Peguei uma cadeira alta o suficiente para ficar com a cara colada no vidro que dava para o estúdio do Maquinaria. Eu me abaixei para pegar o caderno e meus ouvidos, partes paradoxais do meu corpo treinadas para se surpreenderem, foram tomados de repente pela explosão da bateria e as paletadas rápidas de “Somebody Told Me”, do The Killers. Vi um Matheus ainda nervoso, cantando muito e de braços cruzados até o quase final da música. Depois de um dos slides feitos no baixo do Lucas Santiago, a música subiu de tom e os braços foram descruzados. A Drunken Tales já estava inteira ali.
Depois veio “Ruby”, do Kaiser Chiefs, música feita para as guitarras e os microfones dos backing vocal trabalharem juntos. As guitarras e vozes do João Vicente Novaes e Rafael Ribeiro se completaram nos solos simultâneos e nos famosos “AaAaAaaaaa” do refrão. A essa altura, a temperatura já subia, assim como Lucas Santiago, que foi parar no degrau da bateria do Leandro Martins, ou Leandrummer, como prefere ser chamado. A pesada “Juicebox”, do The Strokes, veio logo em seguida. “Hate to say I told you so”, da The Hives, e uma execução foda de “Are you gonna be my girl”, do Jet, transformaram minha caneta em baqueta, motivo pelo qual eu tenho poucas anotações sobre esse momento e só cito, mesmo. (Desculpa por isso. Era sábado).
Matheus anunciou que era hora das músicas autorais. Afinal, era a gravação do EP da Drunken Tales e era esse o motivo de ter gente da Avenida lá (e porque a Drunken Tales precisava de um vocalista). Antes de falar da primeira música, é preciso falar de mitologia grega. Sabe a lenda do Ícaro? Aquele filho de Dédalo, morador da ilha de Creta e perdido no labirinto do Minotauro, que tentou escapar voando do labirinto, porém chegou perto demais do sol e suas asas derreteram? Então. Com base marcante com os característicos slides acompanhados pelo pizzicato de 3 dedos da mão direita dobrada do Lucas Santiago, veio “Ícaro”. A música ganhava peso à medida em que voava mais alto. Depois do refrão, como se tivessem chegado perto demais do sol, veio o solo de guitarra e o peso caiu para a base em que começou. Se foi de propósito ou se é só viagem minha, eu não sei. Sei que, se não pensaram nisso, podem usar isso agora haha. O refrão também serve para te tirar do fundo do poço: “Todas as pessoas que disseram que você não era nada demais/ Mostre pra elas que o céu é o limite e asas é você quem faz”.
“A questão é: Quanto tempo teremos que esperar” até podermos ouvir essas músicas gravadas? Fica no ar o mistério. Mas adianto que a faixa “Volátil”, em especial, foi executada com muita energia pela banda toda. Matheus fazia menção de que ia voar enquanto cantava “qual a maior velocidade de volatilidade? Éter, gasolina ou a sua relação sem um pingo de dopamina?”. A música também tem ótimas viradas de bateria do Leandrummer.
A próxima música era de tema forte, então afinadores colocados nas mãos dos instrumentos indicavam: a banda tá quase pronta pra falar desse assunto. Quase pronta e... deram o sinal verde. “Letra da mulher”. Surdo e caixa trabalharam em conjunto por um tempo até darem lugar ao chimbal dançante, e traziam os versos “Já não aguentava mais ser maltratada/ Não me venha com essa cara/ dizendo que não era sua intenção/ o seu medo agora vive/ o medo sempre foi a sensação que senti/ desde que nasci/ mulher”.
Virou o dia, chegou o horário de verão e, com ele, a dúvida constante sobre que horas eram. Meu celular tava certo? Ele mudou sozinho? “Cansei de pensar” veio no momento certo. Rafael Ribeiro começou a música e, confesso, eu a colocaria como trilha para vários jogos de Super Nintendo. Na outra guitarra, João Vicente Moraes usava um slide no dedo anelar. “Cansei de pensar/ Pensar não dá dinheiro/ Cansei de mudar/ Mudar para ser aceito”. Sim, a letra me ajudou a continuar vendo videogames nas coisas.
A última autoral foi a única em inglês. “Try again” também foi a única a ter João Vicente Novaes assumindo o vocal principal. As viradas usando a caixa vieram algumas vezes na música, no que parecia o final, duas chamadas no surdo fizeram a música acelerar. Se achou que ia acabar, try again.
O repertório pré-definido acabava por ali, mas o show tava bom, então foram de Artic Monkeys até 3 da manhã (Ou duas? Ou quatro? Não sei).
No final, conversei pela primeira vez com o Matheus Medeiros, meu veterano na faculdade, calouro na Avenida e um compositor foda. Mesmo sóbrio, vou ficar esperando os próximos Drunken Tales ☺
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